Das Tiras de Jornais as Webcomics

Antes de mais nada, quero avisar que este post é a minha pequena contribuição a Blogagem Inédita promovida pelo Interney (o “William Hearst” da blogosfera brasileira). A proposta dessa “blogagem coletiva” é mostrar que a blogosfera é tão capaz de produzir conteúdo inédito quanto os jornais, e que os blogs não são apenas meros replicadores de notícias (apesar de haver muitos assim). Isso é claro, tendo sempre e mente a máxima de “na Natureza nada se cria…”

Pois bem, apesar do blog do Homem-Grilo não ser exatamente um blog jornalístico, resolvi participar da Blogagem Inédita pois produzo aqui no meu blog um conteúdo original dentro de uma forma de arte que desde os seus primórdios sempre esteve intimamente ligada aos jornais, que são as histórias em quadrinhos. Tanto que é difícil separar a evolução histórica dos quadrinhos da própria evolução da mídia impressa, ao ponto de hoje em dia a migração de ambas para esse mundo virtual da Internet estar acontecendo quase que no mesmo ritmo.

Indiferente de quem tenha sido o pioneiro das histórias em quadrinhos, se foi o ítalo-brasileiro com a série Nhô Quim, lançada em 30 de janeiro de 1869, ou se foi com seu , lançado em 1894, é ponto consensual que os norte-americanos foram os primeiros a desenvolver um verdadeira indústria em torno da chamada nona arte.

E tudo começou lá, nos jornais, primeiramente com as tiras diárias, e num segundo momento, com as páginas dominicais, que tinham esse nome pois os quadrinhos eram publicados nos suplementos infanto-juvenis que vinham junto com os jornais aos domingos, e em geral possuíam um formato tablóide.

As primeiras revistas em quadrinhos propriamente ditas só apareceram no começo do século XX, e ainda assim, não continham material inédito, e serviam apenas como compilação das tiras já publicadas nos jornais. O nome que os norte-americanos deram a essas revistas, comic books, vem justamente do fato dessas primeiras tiras apenas conterem conteúdo humorístico. As tiras de aventuras só iriam surgir por volta da década de 20, influenciadas pelas . No começo não havia um formato padrão para as revistas em quadrinhos, apesar da maioria seguir o formato tablóide por justamente serem compilações das tiras de jornais e dos suplementos dominicais.

E foi por causa desse suplementos, que foi travada uma verdadeira guerra entre os dois magnatas da impressa na época, , dono do Morning Jornal, e , do New York World. Ambos perceberam que os suplementos, e os quadrinhos publicados neles, atraiam uma grande quantidade de leitores para seus jornais, e por tabela, isso também atraia os anunciantes. Então não foi poucas às vezes em que um tentou passar a perna no outro, “roubando” o cartunista que publicava no jornal do outro para seu próprio jornal.

Para acabar com essa bagunça toda foi criado os syndicates, que nada mais são do que agência responsáveis por contratar os cartunistas e distribuir suas tiras pelos diversos jornais nos EUA. Desta forma, os syndicates conseguiam vender as tiras dos jornais a um preço muito barato, permitindo que elas pudessem ser compradas tanto pelo grandes jornais quanto pelos de pequeno porte.

Esse mecanismo, no entanto, se tornou uma faca de dois gumes. Por um lado, beneficiou o cartunista que viu seus ganhos aumentarem com suas tiras sendo publicadas por cada vez mais jornais, até mesmo de outros países, mas por outro, esse cartunista foi perdendo paulatinamente a sua liberdade autoral, e aqueles que não se encaixavam no esquema dos syndicates, dificilmente conseguiam trabalho.

E para esse quadrinistas mais autorais (ou não tão mainstreams), esse é um cenário que perdurou até os dias de hoje, e só começou a se modificar no início deste século, com proliferação da Internet comercial, e o surgimento das primeiras .

A Internet para esses quadrinistas surgiu como uma terra prometida onde antes não havia espaço para publicarem seus trabalhos, tendo em vista que os jornais nos EUA estão cada vez mais diminuindo seus espaços para tiras e quadrinhos, e para os novatos, a situação é mais crítica ainda pois eles não conseguem ter seus trabalhos aceitos pelos syndicates.

A Internet então propiciou que tiras com temas extremamente específicos e que muito dificilmente teriam entrada em jornais impressos, como videogame, rpg e cultura nerd em geral, se tornassem grande sucesso de público, e permitiu que seus autores pudessem ganhar dinheiro e produzir seus quadrinhos de forma independente, sem precisar estar ligado a um syndicate ou até mesmo a uma editora.

Assim, encabeçado por caras como Dave Kellet, Brad Guigar, Kris Straub e Scott Kurtz, as webcomics começaram a se espalhar pela Internet numa quantidade absurda, e muitas, possuindo uma qualidade excelente. Aliás, não por acaso esses quatro autores se reuniram para escreverem um livro onde relatam suas experiências, chamado How To Make Webcomics.

Já aqui no Brasil as webcomics ainda não estão tão difundidas como lá fora, apesar de a situação para o quadrinista brasileiro que vai tentar publicar de forma impressa ser até mais adversa do que lá nos EUA, dado que aqui não apenas não há mais espaço para novos cartunistas nos jornais (seja os grandes ou pequenos) como também nunca tivemos de fato um mercado de quadrinhos nacional que acolhesse os profissionais brasileiros (tanto que pra fazer sucesso, os desenhistas são obrigados a trabalhar pro mercado externo).

Mas pouco a pouco esse cenário vem mudando e o número de webcomics brasileiras vem aumentando progressivamente. Uma das webcomics tupiniquins de maior sucesso é com certeza os Malvados de André Dahmer, mas existem também outras muito boas, como vocês podem conferir nas indicações que faço no meu blogroll “Quadrinhosfera” na coluna a direita.

E termino esse post com uma pergunta: quem sabe não esteja nas webcomics, a saída para que se crie finalmente um mercado de quadrinhos brasileiros que não se limite apenas a turma da mônica, hein?

7 thoughts on “Das Tiras de Jornais as Webcomics

  1. Olha, como amante, colecionador e quadrinista fracasado:o), devo dizer que nada tira o prazer e folhear o papel, sentir o seu cheiro e se deleitar lendo HQ. Quadrinhos no computador ainda para mim é algo meio que estranho.

    Mas tudo é válido para que o mercado de quadrinhos tupiniquim cresça!

  2. Belo post! Muito bom mesmo…

  3. Cidão, trabalhando como professor de História no ensino fundamental, percebi através dos meus alunos que esse apego ao papel não existe neles, que pertencem a assim chamada geração digital. Esse apego tátil ao papel é algo mais da geração anterior a Internet do qual eu pertenço, e acredito que seja o seu caso também. Mas para a geração digital, pouco importa o veículo em que os quadrinhos estão sendo publicados, se o papel, o monitor do computador, ou a telinha de um celular, eles encaram tudo da mesma forma.

    Primo, valeu pelo elogio.

  4. Caro Cadu e toda a trupe do site: ando acompanhando o site há algum tempo e estou achando muito bacana. Não só os quadrinhos, mas também o restante dos posts. Fiz um registro do site lá no meu blog, se puderem dêem uma passada lá: http://www.saposvoadores.net . Até +

  5. Valeu pela divulgação, Ricardo.

  6. Opa! Gostei de mais do artigo e dos links!

    Na empresa onde eu trabalho acabamos de criar uma webcomics diferente.

    Uma webcomics colaborativa, onde os próprios usuários enviam roteiros, e o mais votado semanalmente vira tira.

    bug.d3estudio.com.br/?paged=2

    Acho que a saída da mídia impressa pode ser mais que uma solução de publicação, pode ser uma oportunidade de usarmos a web para interagir com as pessoas e criar uma nova maneira de fazer aquilo que amamos.

    De novo, parabéns pelo post!

    Abraço

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